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Os assaltantes não escolhem cor, credo, raça, idade ou posição social. Assaltam o pobre, o preto, o branco, o rico, o alto, o baixo, o bonito, o feio, o desembargador, o juiz, o ministro do Supremo Tribunal Federal, o Ministro da Fazenda, o filho do ministro, o amigo do ministro, o promotor de justiça, o filho do promotor, o delegado, o policial, o defensor público, a criança, o adulto, o velho, o novo, o sadio e o doente. E qualquer um pode sucumbir diante da arma de um assaltante, bastando, para tanto, que se tente frustrar-lhes a expectativa. Nesse contexto deve-se, sim, punir o meliante, exemplarmente, para preservar o pouco de liberdade que ainda nos resta e para desestimular a prática de crimes. Nós, julgadores, não podemos nos aliar à arrogância e ao descaso de nossas elites e governantes, para os quais essas questões só são levadas à ribalta no período eleitoral.Juiz José Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7ª Vara Criminal da Comarca de São Luis, Maranhão ___________________________________________________
Publico a seguir uma sentença condenatória que, para mim, é emblemática; emblemática porque traduz o dia a dia de uma vara criminal. O dia a dia de uma vara criminal, para quem não sabe, para quem vive distante do nosso mundo, é o processamento de jovens, muitos da classe média, que assaltam, infernizam a nossa vida, com o único objetivo: conseguir dinheiro para beber e consumir drogas.
No caso sub examine, os acusados, três jovens, sairam num carro de um deles para uma noitada. Em determinado momento, sem dinheiro para prosseguir a farra, sairam em busca de uma vítima.A primeira que encontraram assaltaram. Mas não se limitaram a assaltar. Foram além. Decidiram espancar a vítima, injustificadamente. Depois do assalto, que pouco lhes rendeu, foram presos e, agora, condenados.
O assalto é o flagelo dos nossos dias. E, mais grave ainda – o que mais causa indignação – , é que 99% dos assaltam são, repito, praticados por jovens, com o único objetivo: amealhar dinheiro para beber ou consumir drogas.
Aqueles que pensam que os assaltam ocorrem por causa das injustiças sociais, é bom repensar e fazer uma pesquisa nas varas criminais.
Em determinado fragmento, preocupado com os abalos psicológicos infligidos às vítimas, consignei, como o tenho feito iterativamente:
“[…] Os efeitos da violência sobre as vítimas, ao que parece, nunca foram considerados por aqueles que têm o dever de resguardar a ordem pública. Fala-se muito em direitos dos acusados e pouco se pensa na situação das vítimas. Os acusados – que, ao que parece, têm sido a única preocupação dos órgãos persecutórios – empertigados, ufanosos, continuam, depois do crime, levando a mesma vida de sempre: batendo papo na esquina, tomando uma cerveja com os amigos e dançandoao som de uma potente radiola; as vítimas, acabrunhadas, melancólicas, passam a temer a sua própria sombra, evitam sair de casa, deixam de frequentar as rodas de bate-papo, têm pesadelos, perdem a paz e a tranquilidade. Os acusados, depois de colocados em liberdade – ou ainda que presos permaneçam – comparecem às audiências de cabeça erguida, imodestos, petulantes, soberbos; as vítimas, deprimidas, desalentadas, são obrigadas a comparecer às audiências sob disfarce, sorrateiramente, com as mãos sobre o rosto, amedrontadas, aterrorizadas, pávidas e receosas. Depois das audiências, os réus deixam o Fórum, sobranceiros, verticais, impávidos, intrépidos; as vítimas, de seu lado, deixam o prédio do Fórum sub-repticiamente, dissimuladamente, sorrateiramente, com as mãos sobre o rosto, deprimidas. Pena que esse quadro não seja objeto de preocupação de muitos que, ao que parece, perderam, de vez, a sensibilidade […]
Noutro fragmento, anotei, na mesma senda do que venho dizendo há muitos anos:
“[…] Vivemos uma quadra difícil. A violência bate à nossa porta. As vítimas fatais da violência se multiplicam. Ontem foi o vizinho, o conhecido, amanhã pode ser uma pessoa muito mais próxima de nós. Os meliantes estão cada dia mais ousados. Enquanto os meliantes agem com sofreguidão, nós agimos com frouxidão. O Estado está de cócoras diante do criminoso e da criminalidade. Eles nada temem. Eles não respeitam ninguém – nem pai, nem mãe, nem polícia, nem promotor, nem juiz e nem o papa. Essa falta de respeito decorre do fato de eles não acreditarem em nossas instituições. Eles não acreditam na repressão. Tudo para eles é superável. Tudo para eles é irrelevante. A impunidade os estimula a pensar assim. Até a vida do semelhante, se necessário, eles subtraem para a consecução do seu intento. Para eles, tudo é menor, tudo é insignificante. O que lhes importa mesmo é o bem da vítima porque, de posse dele, realizam alguns dos seus desejos mais prementes – o uso de drogas e de álcool. E o que é pior, com o comprazimento, com a complacência de muitos.
Nós todos – juízes, promotores, polícias, etc. – temos que sair da inércia. O promotor de justiça tem que deixar o gabinete e sair à procura de provas. O juiz tem o dever de agir com rigor e sofreguidão. Nós não podemos ficar aguardando que as provas caiam do céu como por encanto. Não podemos, desalentados, desanimados, deixar que os meliantes nos intimidem. Nós não podemos, entorpecidos, estagnados e sonolentos esperar que apenas a parte interessada pela liberdade do acusado traga provas aos autos. Essa letargia, essa paralisia, essa tibieza nos apresentam fracos, anêmicos e covardes diante do meliante e da opinião pública. Em face da nossa aparente (?) frouxidão, da nossa timidez, o meliante se sente mais forte, mais ousado, mais destemido […]
A seguir, a sentença, por inteiro.
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